Sem doença não há cura,
Sem cura há doença,
Sem doença não há doente
Sem a dor dessa ausência.

Com doença há doentes,
Com doentes há doenças.
Nem mesmo a cura alivia
Minha fatal sentença.

Mais cura no doente
Menos cura na doença,
Doença que se cura
Na cura de sua crença

O inferno do doente
É o céu da doença,
Mas a cura do enfermo
É a doença da presença.








Confessar vícios não é fácil. Alguns tentam esconder e o fazem bem por muito tempo. Outros negam o vício para si próprios como se isso fosse eficiente; é como a criança que fecha os olhos quando vê algo ruim pensando assim que o mal não acontecerá só porque ela parou de observar. Outros não sabem que possuem determinado vício até alguém lhes dizer. Eu tenho um vício: Sou viciado em metodologia. E é uma merda. Isso quebra os sonhos. Leio Marx e penso: Isso seria fantástico! Leio história e penso: Isso é impossível. Do que estou falando? Estou falando sobre uma sociedade justa. Acho que é o sonho de qualquer um. Até os mais terríveis capitalistas, aqueles que venderiam uma garrafa d'água no deserto por duzentos reais pensam nisso às vezes. Em todas as buscas por igualdade social nos esbarramos em algo invisível: Metodologia. Se uma sociedade ideal existe no campo da ideias, a transformação entre o real e o imaginário só pode ocorrer com a metodologia adequada. Todas as metodologias utilizadas até esse momento fracassaram. O sangue das vítimas foi posto embaixo dos tapetes. Bocas foram costuradas pelas agulhas da censura e nada foi feito para reverter isso. Hoje tentamos esvaziar o oceano com uma caneca: Distribuindo esmolas para que muitos morram de fome lentamente com uma angústia no peito que pode durar algumas décadas. É a forma mais cruel de se matar alguém. Até que me mostrem a metodologia antes de ser posta em prática qualquer ideologia ideal, seja lá o que isso signifique, permanecerei cético e estático. Aquele que se dispuser a criar a metologia que a faça em detalhes com todo o rigor científico e distribua para que duzentas milhões de pessoas possam ler. Um texto como esse eu imagino que deveria ter uma duas mil páginas, porque não poderia faltar nada. O desafio está lançado. Eu serei o primeiro a ler com muita atenção. Se ninguém fizer isso eu talvez o faça num futuro distante. Já até pensei no primeiro passo: Construir uma enorme máquina de se fazer dinheiro. E que ninguém questione minha metodologia!

-Olá Alfredo, sentimos por sua mãe.
-Acho que a senhora está me confundindo com outra pessoa.
-Não Alfredo, eu sei exatamente quem és tu.
-Tenho certeza que está, para início de conversa meu nome é Carlos.
-É uma situação terrível Alfredo, mas negar a realidade não vai mudá-la.
-Que realidade? Quem quer mudá-la? Tenha paciência, eu nunca te vi senhora, tu nunca me viu e acha que sabe alguma coisa sobre minha vida.
-Nos conhecemos há muito Alfredo, sei quase tudo sobre a sua vida. Sei que mora na Rua da Independência, numero 407. O nome de sua mãe é Maria.
-Rua da independência? A senhora chega  ser risível, eu moro no centro, na Avenida dos Perdizes. Olhe como estou vestido, já viu alguém nessa ruazinha se vestir assim? Ah! E o nome da minha mãe é Lurdes e ela está ótima.
-Apesar da sua deselegância, te mostro a prova. Aqui está a cópia da documentação que você nos deu ao fazer o registro imobiliário na Rua da Independência. O senhor da foto é inegavelmente você. Olhe a assinatura, não é tua?
-Olhe senhora, o que vejo aqui é uma brincadeira de mau gosto, não tenho paciência para isso, sou um homem ocupado. Uma montagem mal feita como essa não engana uma criança. E essa assinatura não é minha.
-Também tenho mais o que fazer, apenas assine o atestado de óbito e pague a taxa.
-Assinar algo de outra pessoa? Já disse: MEU NOME É CARLOS! Até nunca mais!
-Motorista, leve-me até minha casa. Chamaram-me até aqui para fazer perder tempo.
-Desculpe senhor, mas eu não te conheço.
-Só me faltava essa Cézar, você me trouxe até aqui.
-Meu nome é Cezar, e eu espero por Carlos.
-Será que eu troquei de rosto lá dentro? Quem acha que sou eu? O Benezeu?
-Não sei.
-Legal, deve haver câmeras aqui fora também e um bocado de gente escondida pronta para gritar que isso é uma brincadeira, mas vou logo avisando que não estou com humor para isso. Pegarei um táxi Cézar e amanhã trate de buscar um novo emprego.
-Que seja.
O taxi chegou.
-Perdizes 1105.
-É para já.
O táxi anda.
-Trinte e quatro amigo.
-Tome cinquenta e fique com o troco.
-Muito obrigado.
A chave não entra na fechadura.
-Se isso for um pesadelo, eu espero um banho de água fria agora. Que droga! Que droga!
-Não estou acreditando que estou fazendo isso. Taxista por favor me leve à rua da Independência.
Na rua da independência há uma enorme comoção.
-O que é isso?
-Velório doutor.





Por que o judiciário brasileiro impõe respeito e o legislativo e o executivo nos apavoram repetidamente? Para um cidadão comum se tornar juiz é necessário uma formação em direito, que dura em média cinco anos de estudos, precisa-se ainda executar um trabalho com função jurídica por mais três anos e passar no concurso onde há uma prova escrita e prova de títulos; detalhe: É necessário escolher uma área específica, visto que o conhecimento jurídico é extremamente amplo. Assim, são oito anos na área fora o tempo de estudos e preparação para passar no concurso; portanto não é exagero dizer que se leva praticamente uma década para alguém chegar a ser chamado de juiz. Agora me responta: Quanto tempo de preparação é necessário para ser presidente? Quanto tempo é necessário para ser deputado, senador ou governador? Acho que todos sabemos a resposta. Hoje o Estado existe. Hoje há desigualdade social. Hoje há de ser feitas melhorias legislativas e executivas, logo não podemos deixar de escolher representantes para o executivo e legislativo; mas é realmente correto qualquer um assumir a função? (desde que tenha votos, é claro). É uma reflexão importante e deve ser feita. Como alguém pode criar um lei ou melhorá-la sem nunca ter refletido sobre esta? Como alguém pode assumir altos cargos executivos sem saber o mínimo sobre administração pública, economia, sociologia ou até mesmo história? Enfim, fala-se apenas que moral ilibada é condição suficiente para alguém assumir um cargo público mediante voto popular, e nada é falado sobre competência. O produto que receberemos de legisladores e executores são frutos da competência das pessoas que lá estão. Quando tal assunto é posto em pauta, o famoso argumento de que somente a famosa "elite" seria eleita se exigíssemos prova de competência, é invocado automaticamente quando tal assunto é posto em pauta, porém tal argumento é altamente questionável e também pode ser discutido. Enfim, para não prolongar o texto, é bom dar um exemplo: A PEC 241, mais uma vez, será votada por algumas pessoas sem conhecimento econômico. Tal proposta decidirá a vida de duzentas milhões de pessoas pelos próximos vinte anos. Os cartazes e bandeiras contra ou a favor são levantados imediatamente por pessoas que também não tem o mínimo de conhecimento necessário para isso. Parece inocente esperar que as decisões tomadas sejam baseadas em análise apurada dos prós e contras da situação e não baseadas em sentimentalismo barato ou interesses particulares.

Paro de respirar por alguns segundos e troco a velha máscara que me mantém vivo. A anterior já tinha quase um ano e tive que comprar uma nova; me custou praticamente o salário do mês. Há dois meses meu vizinho de baixo faleceu por não ter dinheiro para trocar a sua. Foi a maior confusão. Os parentes não tinham dinheiro para colocar o corpo debaixo da terra. Um primo do falecido se prontificou a transportar o corpo, cavar o buraco e colocá-lo dentro, mas a proprietária da terra onde esses gentis rapazes sem vida costumam ir, não negocia com ninguém; dinheiro na mão ou então o defunto terá que ser despachado para outro canto. Alguns desafortunados são atirados ao mar e passam a eternidade filosofando com as tartarugas marinhas. Não sei exatamente como chegamos à essa situação, mas alguns dizem que foram as grandes empresas que fizeram isso com ar para que estas coexistam eternamente. Os tubos de oxigênio foram os últimos itens da lista maquiavélica; a lista que diz que tudo deve ser pago, com dinheiro, com trabalho ou com sangue. Tais empresas já nos obrigava a pagar por itens essenciais como água e comida há séculos, mas dizem que o ar era gratuito. Gratuidade essa que hoje não existe; ele está poluído para chuchu. Afirmo categoricamente que as coisas estão poluídas para chuchu. Não sei se é o ar ou o solo, mas o vegetal não cresce nas cercas há décadas. Mal conseguimos enxergar o sol, o dia parece esfumaçado na maioria das vezes, é necessário colocar um óculos ridículo antes de sairmos de casa para que nossas retinas não fritem como batata na frigideira.  Tentamos falar sem parecer um robô, pois a máscara é enorme e nossa boca fica totalmente oculta. Para comer é a pior parte, quando se tem o que comer é claro. Para dormir incomoda muito e quando eu acordo sinto que há várias marcas causadas, mas não consigo vê-las. O tubo de ar puro há de ser carregado para todo canto, e tomo banho com ele na costas, já que não posso parar de respirar nessa ocasião. Estive pensando uma coisa, que parece boba. Eu não me importaria em pagar por tudo isso, sério, não me importaria, pagaria com prazer pela água que bebo, pelas plantas transgênicas que como, pelas roupas de algodão que visto, para ver o mar, para pisar na grama ou na calçada e também para respirar, mas não tenho dinheiro e nada me garante que um dia terei. Mas o que mais me aflige é uma frase incansavelmente repetida por aí: Todas as ideologias estão mortas.

O que é liberdade? Será que isso, de fato, existe? Quando nascemos, aprendemos a falar uma língua, vamos à escola aprender o que pessoas mais velhas têm a nos ensinar, comemos o que não gostamos porque dizem que é saudável e a medida que crescemos passamos a fazer mais coisas e cada vez menos entendemos o porquê de estarmos fazendo aquilo. Um simples acidente geográfico te faz falar português e não inglês, gostar de tomar chá e não café; te faz saber muito ou pouco sobre determinado assunto e ainda te faz a passar todos os dias fazendo "A" em vez do fato "B". Mas será que esse acidente geográfico, chamado nascimento, é o único fator que influência no que vamos escolher? Em primeiro lugar é preciso dizer que o próprio nascimento é por si só restritivo; não escolhemos onde vamos nascer. A partir desse momento há a ilusão de que podemos escolher algo, o que não é verdade. Ninguém escolhe qual língua vai falar já que aprendemos por repetição nessa fase da vida. Ninguém escolhe se vai ser rico ou pobre, já que o fator nascimento é o primeiro que diz isso ao individuo e depois a sociedade ditará regras que o levarão a ter muito ou pouco dinheiro. Alguns dirão que neste caso a pessoa terá escolha, pois se muito se esforçar obviamente conseguirá algo que a maioria não possui; mas isso não significa ainda liberdade. Se algo depende de sua capacidade e não escolhemos se teremos muita ou pouca capacidade, isso também reforça que não temos controle sobre isso. Dentro da sociedade a liberdade é nitidamente roubada das pessoas por pessoas com maiores poderes e com poder econômico maior. Não só por isso, as próprias relações que teremos que enfrentar todos os dias nos impedem de agir como gostaríamos e nos privam de fazer praticamente tudo o que gostaríamos. Enfim, então temos a escolha de sair da sociedade e morar sozinho no meio da selva certo? Temos claro, mas ainda não seremos livres. Como não? Se não há pessoas que possam te restringir de fazer algo, há outras coisas que podem. Na selva, a força da natureza ditará as regras e você será um mero escravo para permanecer vivo. Neste caso as restrições serão tantas que o indivíduo sentirá saudade da vida em conjunto. No fim, ainda haverá um último argumento: Avançar surrealmente a tecnologia a ponto de um ser humano conseguir morar sozinho num planeta e não se preocupar com predadores, fome, dominação, etc. Nesse caso, se ainda desprezarmos que na solidão também há falta de liberdade, não podemos considerar o solitário dono do planeta um indivíduo livre, pois este estará sujeito as leis físicas do universo. No fim, os argumentos vão se esgotando e nos perguntamos novamente quando seremos livres? E a única resposta plausível para tal questão é: Seremos livres quando não existirmos mais.
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